Magazine de Escrita Criativa

Memórias - Ano 2150


Lembro-me bem da Primavera… Lembro-me dos meus dias de juventude, em que passeava pelo parque e sentia uma brisa refrescante a acariciar-me as faces. Ao longe, via os bosques a ganharem vida. Então, eu mergulhava na sombra das árvores crivadas de Sol, enquanto observava as flores a desprenderem-se e a caírem como uma chuva de borboletas. Um intenso mar de aromas inflava as narinas e escutava-se o doce chilrear dos pássaros. Olhando para o azul infinito do céu, as andorinhas chegavam depois de uma longa jornada…
Nesse tempo tudo era belo, eu era jovem e não me cansava de contemplar a beleza do mundo.
Mas, os meus fortes cabelos negros tornaram-se finos cabelos brancos, as minhas pernas cambaleantes já não são o que eram. Todo eu estou coberto de um manto de rugas. Sou apenas um velho solitário que vagueia por aí sem certezas, neste longo caminho que é a vida. Há muito tempo que o céu azul foi apoderado de uma escuridão constante... Agora, raramente se vê o Sol. Todavia a temperatura subiu bastante nestas últimas décadas. Tudo começou com a ganância e o egoísmo das pessoas. A guerra pelo petróleo destruiu países inteiros e mortíferas epidemias têm devastado o mundo. A vida tornou-se impossível, a pobreza aumentou e já não há crianças. Árvores, arbustos, flores… nada sobrevive. A tecnologia avançou muito, mas de que nos serve isso se o mundo está moribundo? A população diminuiu drasticamente. Dizem que restam cerca de dois mil milhões de seres humanos neste planeta hostil.

A minha família foi levada por uma terrível epidemia e agora não me resta mais nada a não ser as minhas memórias… as minhas memórias dos tempos em que havia Primavera… Já não há uma estação do ano, propriamente. Está um enorme e abafado calor por toda a parte, tanto chove como ficamos a secar e a chuva, quando cai, é cada vez mais ácida e venenosa.
Tentei lutar contra a possibilidade de um mundo assim, mas a única coisa que consegui foi um internato neste asilo. Dantes era religioso, acreditava que talvez Deus ouvisse as minhas preces e nos livrasse deste inferno. As coisas pioraram e a minha fé estatelou-se. Recentemente, extraterrestres vieram em missão de paz, mas tornaram-se nossos inimigos mortais devido à nossa terrível hospitalidade. Ninguém está feliz e a taxa de suicídios tem aumentado monstruosamente. Não sinto vontade de acabar com a minha vida. Apesar de tudo, ainda me restam as memórias da Primavera, das rapsódias coloridas, dos cheiros e das formas dos jardins, da alegria e a da paixão, dos sorrisos das crianças que se misturam com as metamorfoses dos tempos passados!
[Gabriela Magalhães, 8ºB]

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